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out/03

Em 2003, Portugal foi gravemente ferido pelos fogos florestais. Cerca de 420 mil hectares (uma área equivalente ao distrito de Vila Real) arderam impávidamente perante o olhar lacrimejado do país e sobretudo das pessoas cujo fogo lhes roçou indelével a pele.

O fogo arrombou, pilhou e destruiu a casa de muitos portugueses. Rios de lágrimas sulcaram os rostos de quem viu a sua memória em cinzas. Uma pessoa sem a sua memória sente-se nua. O desespero levou a que muitas pessoas combatessem o fogo lançando, inocentemente, pequenas bacias e baldes de água para o ventre do intacto inferno. A água não chegou, recolheram as lágrimas em frágeis recipientes.

Quando o céu se despiu das trevas e a noite recuperou a sua escuridão, a desolação esgaravatava as cinzas à procura da terra perdida. Com o fogo já extinto a água continua a ser necessária para o renascimento. Os sobreviventes são fortes, sem nada no corpo recolheram as lágrimas em frágeis recipientes achados, na hora da reconstrução nada se desperdiça.

Estas fotografias são a ficção do que vivi como espectador longínquo. Mas, como Cesare Pavese já escreveu:
"A imaginação humana é imensamente mais pobre do que a realidade."